PRESCRIÇÕES PRAIANAS PARADISÍACAS - PARTE 1

Marta Leiria

A ideia era fugir do frio de junho com destino ao litoral e passear de Havaianas até o sol se pôr. Não sem antes consultar o providencial praiômetro do Ricardo Freire. No site viajando na viagem, ele explica aos navegantes como funciona o medidor: as melhores praias do mundo estão ali catalogadas com a média de chuvas dos últimos anos, mês a mês. Então a probabilidade de aguaceiros pode ser levada em conta para escolher onde praiar. A filhota e eu elegemos as paradisíacas Caraíva e Trancoso, sul da Bahia, distribuídas em uma semana. Na saída de Porto Alegre, míseros cinco graus rumo a outro Porto, o Seguro, onde para nós, gaúchos, é verão de verdade. Optei por um par de tênis nos pés e outro, just in case, na bagagem de mão — mala despachada não mais, nem mesmo para enfrentar a neve europeia.

Para saber se Caraíva é a tua praia, caro leitor, prestatenção! O vilarejo tem parte do seu conjunto arquitetônico e paisagístico tombado pelo Iphan, e lá se chega de barquinho a remo atravessando o rio. O trânsito de veículos é proibido e carroças somente transportam pessoas com mobilidade reduzida e bagagens, tudo para não sobrecarregar os jegues. O pequeno vilarejo formado por casarios antigos e multicoloridos só recebeu iluminação pública em 2008. Os habitantes exigiram fiação subterrânea, não aceitaram postes de luz para não apagar a luz das estrelas. As ruas não possuem calçamento e com a chuva tudo vira um espetacular barral. Ou seja, tênis são inúteis por lá. Não. Caraíva não é para os fãs incondicionais de assépticos resorts.

Escolhemos a Pousada da Lagoa, uma instituição local. O atendimento da proprietária Nina, e da Thereza, com dicas sobre os melhores passeios, restaurantes e com incríveis histórias para contar, tornaram a viagem inesquecível. É um sítio com bangalôs bem afastados uns dos outros e decoração primorosa, cada um com aberturas de uma cor. Na entrada dos bangalôs, bacia para o lava-pés, ideia trazida pela Nina de viagem à Tailândia. E o que dizer do pessoal da cozinha com seus indefectíveis bolos, pães de queijo, tapiocas variadas, geleia caseira? Na porta de entrada da pousada (porteira, na verdade) transitam livremente alguns jegues locais, como o Olavo. Ele trabalhava tracionando carroça, como os demais taxis de lá. Estava velho e cansado e a população resolveu adquirir do proprietário sua carta de alforria. Após o café da manhã na companhia da Duca, dona de um restaurante vegetariano, o Olavo passeia livremente pela praia, pelas ruelas e onde mais lhe der na telha. Não há televisão na pousada. E, ao menos para nós, não fez nenhuma falta. O sossego e o silêncio da noite só dão espaço à sinfonia proporcionada pelo coaxar dos sapos na lagoa. Coisa de outros tempos, como aqueles vivenciados na fazenda do meu avô quando pequena, onde a iluminação era à base de lampião a querosene.

Na praia da barra do Rio Caraíva, local de seu encontro com o mar, assistimos ao pôr do sol divino, à altura do porto-alegrense no Guaíba. Visitamos de barquinho, rio acima, e seguindo uma pequena trilha a pé na mata, a Reserva Porto do Boi, dos Pataxós. Participamos de danças com os indígenas e outros turistas, almoçamos com eles banana da terra, peixe assado na folha de patioba, espécie de palmeira, e farofa (sem talheres). Fizemos a lavagem espiritual na cabeça com água aquecida e ervas em uma caldeira, que delícia! Outro passeio imperdível foi o de lancha pelas espetaculares Praias do Satu e Espelho. Também não dá para dispensar a trilha de bugue para relaxar al mare na paradisíaca Ponta do Corumbau.

E até aqui os tênis não foram usados. Até breve! Nos encontramos no próximo texto.

 

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